COLETES.
É Inverno.
Nas profundezas da terra vulcões alimentam-se da energia elementar. Essa, soltar-se-á quando o entender. Nada a parará. Quem se propuser enfrentá-la será destruído. O ser-humano assiste há milénios a essa luta perene entre o Fogo e o Gelo. A esse propósito, dou lugar ao grande Jorge de Sena:
A PortugalEsta é a ditosa pátria minha amada. Não.Nem é ditosa, porque o não merece.Nem pátria minha, porque eu não mereçoNem minha amada, porque é só madrasta. A pouca sorte de nascido nela.quanto esse arroto de passadas glórias.Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta Amigos meus mais caros tenho nela, saudosamente nela, mas amigos sãode esgoto atlântico; irrisória facepor serem meus amigos, e mais nada. Torpe dejecto de romano império; babugem de invasões; salsugem porca de lama, de cobiça, e de vileza,terra de funcionários e de prostitutas,de mesquinhez, de fatua ignorância; terra de escravos, cu pró ar ouvindo ranger no nevoeiro a nau do Encoberto; devotos todos do milagre, castosà luz do sol calada, arrebicada, pulha,nas horas vagas de doença oculta; terra de heróis a peso de ouro e sangue, e santos com balcão de secos e molhados no fundo da virtude; terra tristeterra-museu em que se vive ainda,cheia de afáveis para os estrangeiros que deixam moedas e transportam pulgas, oh pulgas lusitanas, pela Europa; terra de monumentos em que o povo assina a merda o seu anonimato;como esses sentimentos de oito séculoscom porcos pela rua, em casas celtiberas; terra de poetas tão sentimentais que o cheiro de um sovaco os põe em transe; terra de pedras esburgadas, secas de roubos e patrões, barões ou condes;ó terra de ninguém, ninguém, ninguém: eu te pertenço. És cabra, és badalhoca, és mais que cachorra pelo cio, és peste e fome e guerra e dor de coração. Eu te pertenço mas seres minha, não
Labels: apocalipse, cidadão do mundo, lei a menos, pensar e agir, vítimas do fascismo
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